Anseios: raça, gênero e políticas culturais de bell hooks
- Luís Francisco
- 28 de fev.
- 4 min de leitura
Para bell hooks, a melhor crítica cultural não precisa separar a política do prazer da leitura, como se uma coisa não pudesse ser também a outra, como se o pensar não pudesse ser um ato de sentir. Anseios junta alguns dos primeiros textos da autora, escritos nos anos 1980, e que já mostravam a força e a delicadeza do seu olhar. São ensaios que falam de pedagogia, de pós-modernismo, de política, mas que também mergulham no cinema, na literatura, na arte. Hooks examina filmes como Faça a Coisa Certa, de Spike Lee, e Asas do Desejo, de Wim Wenders, e escreve sobre autoras como Zora Neale Hurston e Toni Morrison, sempre com uma atenção que é ao mesmo tempo crítica e amorosa.

O que resulta é uma coleção de textos que não querem apenas analisar o mundo, mas transformá-lo. Hooks escreve com a convicção de que a cultura pode ser um espaço de resistência, de libertação, de cura. Cada ensaio é um passo nessa direção, um gesto que aponta para um futuro onde as estruturas opressoras possam ser desfeitas, onde o domínio dê lugar à partilha. E é isso que faz deste livro não apenas uma obra de crítica, mas um ato de esperança, um convite para sonharmos juntos um mundo mais justo, mais humano.
bell hooks é uma das vozes mais importantes do feminismo, uma pensadora que escreve com as mãos e com o coração. nasceu em 1952, em Hopkinsville, uma pequena cidade do Kentucky, nos Estados Unidos, onde o mundo ainda estava dividido pela segregação. o seu nome de batismo era Gloria Jean Watkins, mas escolheu chamar-se bell hooks, em homenagem à bisavó, Bell Blair Hooks, uma mulher de palavra forte, que não tinha medo de dizer o que pensava, de erguer a voz e fazer-se ouvir. essa herança de coragem e verdade parece ter passado para ela, que se tornou uma das maiores intelectuais do nosso tempo.
como estudante, passou por universidades como Stanford, Wisconsin e Califórnia, e mais tarde ensinou em Yale, na Universidade do Sul da Califórnia e na New School, em Nova York. em 2014, fundou o bell hooks Institute, um espaço dedicado ao pensamento e à transformação. ao longo da vida, escreveu mais de trinta livros, onde aborda questões de raça, gênero, classe, educação, crítica de mídia e cultura contemporânea. a sua escrita é uma ponte entre o académico e o pessoal, entre o político e o poético. bell hooks não fala apenas para a mente; fala para a alma, para aquilo que nos move e nos faz querer mudar o mundo.
Ainda que há anos eu já escrevesse textos de crítica cultural para revistas, Anseios foi a primeira compilação do meu trabalho em formato de livro. Fiquei entusiasmada ao reunir os diversos ensaios desta coleção, pois isso possibilitou que eu expressasse meus vários interesses teóricos. Ao escrever sobre cultura popular, pude mobilizar as interseções entre raça, classe e gênero. Além disso, eu tinha descoberto, em sala de aula e ao proferir palestras, que a utilização de textos visuais, filmes, obras de arte ou programas de televisão como base para falar sobre raça e gênero cativava o público. Todas as pessoas, independentemente de raça, classe ou gênero, pareciam ter ideias e modos de pensar as narrativas visuais que serviam como catalisadores de discussões aprofundadas.
Focar a crítica em produções culturais abriu espaço para a educação voltada à consciência crítica, que poderia servir como uma pedagogia da libertação tanto na academia quanto na sociedade em geral. Ao contrário da teoria e da prática feministas — que, em última análise, exigiam comprometimento com a política feminista e uma ampla transformação na sociedade, percebida como perigosa e ameaçadora —, a crítica cultural permitia um discurso mais democrático. Embora grande parte dos textos de crítica cultural tenham sido escritos de uma perspectiva progressista ou radical, eles não tinham uma agenda militante radical como base fundamental.
Ao contrário da teoria feminista, que vinha de uma discussão mais abstrata sobre o que significa desafiar o patriarcado e criar novos paradigmas culturais, a crítica cultural abordada do ponto de vista feminista envolvia o público de forma mais direta, permitindo que todas as pessoas tivessem espaço para levar críticas radicais adiante. E, acima de tudo, permitia que o público reconhecesse que os sistemas de dominação estão interconectados. Hoje em dia é legal falar de interseccionalidade, da sobreposição entre sistemas como o racismo, o machismo e o elitismo de classe. No entanto, a interconectividade é uma forma mais essencial de disposição dos discursos, pois nos lembra constantemente de que não temos como modificar um aspecto do sistema sem modificar o todo.
— bell hooks, no prefácio
Disponível no LULALIVROS.PT
Anseios: raça, gênero e políticas culturais
Autora: bell hooks
Tradução: Jamille Pinheiro
Prefácio: Luciane Ramos Silva
Edição: Tadeu Breda
Assistência de edição: Richard Sanches
Preparação: Natalia Engler
Revisão: Tomoe Moroizumi & Daniela Uemura
Capa & projeto gráfico: Leticia Quintilhano
Diagramação: Denise Matsumoto
Direção de arte: Bianca Oliveira
Lançamento: outubro 2019
Páginas: 440
Dimensões: 14 x 21 cm
ISBN: 9788593115486
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